Pages

DEVO-TE A TI

Se agora o sorriso é jubiloso 
e não mais os dentes renhidos, 
devo-o a ti.
Se o vento refresca-me a alma 
e não ouço mais os trovões, 
devo-o a ti.
Se as mãos unem-se em harmonia
e trabalham juntas na mesma vontade
exercitando a justiça
e não a jabear nervosas
mas entrelaçadas na verdade.
Se o coração expurgou 
e o sangue não está a ferver em vícios.
E aquele momento se eternizou 
e não mais o esquecimento resistirá.
Se hoje não estou mais morto
como era outrora.
Se sou, sou em ti,
como nunca fui antes 
mas devo-te 
porque em ti vivo 
movo e existo.
Sem ti, 
o que seria de mim?
Não me lembres daqueles dias
nos quais desfalecia como moribundo 
agora sou teu 
e nada me fará voltar ao vômito 
de onde fui tirado 
lavado e vestido em roupas brancas  
a olhar-te, frente a frente 
assim como sempre 
olhou para mim.
Se sou, és porque
tu sempre foi e 
jamais poderia não ser
o eu sou.
E devo-o a ti.  

PAPÉIS

Folhas imóveis perdidas
entre pétalas atraídas
a abandonar o eco desertor
a contender noites recortadas
antes da última ladeira descida.

Verdade oferecida em pagamento
uma e outra arrastada ao lado 
a honra impelida
faz a norma eliminar o vento.

Formas oblíquas queimam-se à raíz
a revelar figuras geométricas
um ou poucos caracteres à vista
como o vagar das causas singulares.

Amores ornamentais cultivados 
em canteiros estreitos
não imitam o laço do passarinheiro
do antiquado alfeizar desviam-se
das mãos mal-vedadas do fustigador.

Retem-se o que se perdeu
na vocação fora do tempo.